Sobre a obra Escuta de Criança no Tribunal — 1ª Ed — 2023
«Escolhi esse tema a partir da minha inquietude com algumas questões: da invisibilidade com que é tratada a criança nos litígios conjugais em varas de família, apesar de o discurso ser o de proteção; do lugar de protagonistas da criança nos processos e a forma como os operadores entendem isso; do equívoco que é feito sobre escuta de crianças, quando se confunde o direito a ter uma oportunidade de ser escutada com o direito de decidir.
A lógica do direito se baseia na produção da verdade judicial e me preocupa a forma como os operadores entendem a necessidade de se produzir a prova, nem sempre harmonizada com a necessidade da compreensão da criança enquanto um sujeito dentro do cenário jurídico. Muitas vezes, e não raro, as crianças são expostas a procedimentos excessivos, desnecessários, repetitivos, inadequados, conduzidos por técnicos não capacitados em escuta de criança e isso, além de caracterizar violência institucional, é uma perversão da lógica da proteção.
Na prática forense, muitas decisões são tomadas baseadas em premissas equivocadas: a de que a criança sempre fala a verdade, a de que o relato da criança foi colhido de forma adequada, a de que a criança tem autossuficiência para tomar decisão a respeito da própria vida. Para além dos vícios de memória e consentimento que podem invalidar o relato e com isso a prova judicial, existem cuidados que devem ser tomados ao se escutar crianças».